Os bastidores do conclave que elegeu Leão XIV


Acandidatura de Robert Francis Prevost no conclave começou a ganhar forma durante um encontro entre os cardeais de língua inglesa, desde os britânicos até o sul-africano Stephen Brislin, passando por representantes de Tonga, Paquistão e Índia.
O inglês emergiu como língua franca desse conclave mais internacional do que nunca, com saudações em “good morning” substituindo progressivamente o tradicional “buongiorno” (“bom dia” em italiano) nos corredores do Vaticano.
A figura central desse processo foi o cardeal de Nova York Timothy Dolan, tido por muitos como o representante de Donald Trump no colégio cardinalício.
Dolan, que já havia sido decisivo na eleição de Jorge Bergoglio no conclave anterior – embora depois tenha se desiludido com Francisco -, assumiu desta vez o papel de articulador entre as facções divergentes da Igreja americana.

Conseguiu alinhar cardeais anti-Trump como Robert McElroy e Wilton Gregory com conservadores como Daniel DiNardo, criando um bloco coeso nos EUA, verdadeiro centro das negociações. O apoio convergiu para Prevost, o candidato perfeito: norte-americano com experiência missionária no Peru, sólido na doutrina, conhecedor da Cúria por ter sido prefeito do Dicastério para os Bispos e poliglota fluente em italiano, inglês e espanhol.
Na contramão, o cardeal italiano Pietro Parolin, favorito das casas de apostas, viu sua candidatura definhar, prejudicada tanto pelo controverso acordo com a China sobre a nomeação de bispos quanto pela fragmentação do grupo mais “bergogliano”, incapaz de unir-se em torno de nomes como o francês Jean-Marc Aveline ou o maltês Mario Grech.
Outro que ficou à margem foi o também italiano Pierbattista Pizzaballa, o patriarca latino de Jerusalém, considerado jovem demais, com 60 anos, e excessivamente político. A virada decisiva em prol de Prevost chegou com o apoio dos cardeais asiáticos e africanos, inicialmente divididos, mas que acabaram por se alinhar com a visão ocidental. Esses votos, que faltaram a Parolin, selaram a eleição do americano.
Agora chamado Leão XIV – nome que homenageia o papa da Rerum Novarum, documento fundador da Doutrina Social da Igreja assinado por Leão XIII (1878-1903) -, Prevost deu pistas de seu perfil em entrevista recente, quando destacou a influência dos pais em sua formação espiritual, numa família multicultural com raízes francesas, italianas e espanholas.
Sua defesa do valor da família, sem mencionar explicitamente o modelo tradicional, foi interpretada como um sinal de continuidade moderada após um pontificado que, para muitos no conclave, abriu excessivamente as portas da Igreja.
Foto: Narcin Mazur / cbcew.org.uk