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Auditoria expõe falhas graves e vantagem milionária no contrato do esgoto

A Prefeitura de Blumenau anunciou, na última sexta-feira (08/08/2025), a revogação do 5º aditivo ao contrato de concessão do sistema de esgoto, firmado com a BRK Ambiental. A decisão do prefeito Egidio Ferrari (PL) foi motivada pelos resultados de uma auditoria técnica independente contratada pelo Samae em 2023, que vistoriou 13.790 pontos da rede e apontou falhas estruturais e operacionais na execução das obras e vantagem financeira indevida à concessionária.

De acordo com o levantamento – obtido com exclusividade pelo Mesorregional – os problemas identificados, como obras mal executadas, infraestrutura em desacordo com normas técnicas e danos ao pavimento, representam hoje um custo estimado de R$ 50 milhões para reparos. O relatório ainda concluiu que parte desses investimentos inadequados foi considerada no cálculo da tarifa durante a terceira revisão tarifária (2022), resultando em um ganho econômico de cerca de R$ 27 milhões para a concessionária — valor pago, na prática, pelos consumidores.

O presidente do Samae, Alexandre de Vargas, destacou que “a população não deve pagar por obras malfeitas” e que o reajuste de 10,72% previsto no aditivo agora está cancelado. A revogação também impede a obrigatoriedade de pagamento da tarifa de coleta por caminhões para moradores sem acesso à rede, permitindo que o serviço seja contratado livremente no mercado.

Ferrari explicou que, quando assinou o aditivo em março, baseou-se em informações da AGIR e da própria concessionária, que alegavam urgência para viabilizar novos investimentos após dois anos sem obras. A auditoria revelou, porém, um desequilíbrio contratual significativo e vantagem financeira injustificada, o que motivou a reversão da decisão.

No final de 2024 o Mesorregional publicou duas matérias sobre o novo aditivo. Questionamos na época a gestão do SAMAE, que estava sendo presido por André Ross Espezim da Silva, que contratou a auditoria, mas ao receber nossas indagações não nos deu retorno, o que mesmo que fez a direção da BRK Ambiental, por isso produzimos um novo conteúdo mostrando a forma descompromissada que BRK e SAMAE estavam tratando o assunto.

A AGIR (Agência Intermunicipal de Regulação do Médio Vale do Itajaí) foi a única a nos retornar, mas Paulo Eduardo de Oliveira Costa, diretor-geral da entidade fez a exigência de que todas as perguntas fossem respondidas apenas presencialmente e fomos até a sede da AGIR e durante uma hora ouvimos uma espécie de defesa da empresa, sobretudo da necessidade real da assinatura de um novo aditivo com o aumento de 11% aos consumidores, além da defesa da utilização de caminhões limpa fossa ao invés da implementação de rede coletora de tratamento.

Agora com base no resultado da auditoria, houve a revogação do quinto aditivo do contrato. O documento técnico detalha nove tipos de falhas no sistema, incluindo poços de visita obstruídos, declividade inadequada, capacidade hidráulica insuficiente, danos estruturais e profundidade de rede fora do padrão. O trabalho também aponta que a AGIR, responsável pela regulação, já havia produzido relatórios de fiscalização em anos anteriores, mas não identificou ou não atuou para corrigir diversas dessas graves inconformidades.

O documento, elaborado pela empresa MPB Engenharia, aponta que o sistema apresenta disfunções técnicas significativas, que podem comprometer a eficiência do serviço e, inclusive, da saúde pública. Além disso, os resultados da auditoria levantam dúvidas sobre a legalidade e a transparência do 5º Termo Aditivo ao Contrato de Concessão nº 017/2010, firmado em março deste ano.

Principais achados da Auditoria:

Com documentos em mãos, o Mesorregional pode conferir com exclusividade que estudo identificou nove critérios de avaliação que demonstram problemas graves na infraestrutura de esgoto, incluindo:

  1. Poços de Visita (PVs) obstruídos ou danificados: 1.817 unidades encontradas com obstruções, afetando 57.253 metros de rede.
  2. Tubos de queda inexistentes: 473 casos em desacordo com a norma técnica (NBR 9649/86), o que acelera o desgaste do sistema.
  3. Profundidade inadequada das tubulações: 1.235 PVs com recobrimento inferior ao mínimo exigido, aumentando o risco de rompimentos.
  4. Declividade nula ou negativa: 365 trechos com problemas de escoamento, causando refluxos e obstruções.
  5. Danos ao pavimento e aos PVs: 6.462 metros de pavimento danificados e 2.553 PVs com avarias físicas.

O relatório foi encaminhado ao prefeito Egidio Ferrari em 6 de agosto, sugerindo, de maneira extremamente técnica que sugere que a concessionária obteve vantagens financeiras indevidas ao incluir investimentos em ativos não conformes com as normas técnicas, o que pode ter inflado artificialmente a tarifa cobrada dos usuários. A Procuradoria Geral do Município (PGM) foi acionada para avaliar medidas legais, como a revisão ou até a revogação do termo aditivo.

Colhendo dados e em contatos com fontes, o Mesorregional ainda obteve a informação que novos detalhes podem surgir e há expectativa que o rombo se aproxime da casa dos R$ 100 milhões. Com isso fica ainda mais evidente que a situação exige transparência e ações rápidas para garantir que os recursos públicos sejam aplicados corretamente e que a população não seja prejudicada por tarifas injustas ou serviços deficientes. A decisão do prefeito, respaldada pelo parecer jurídico, será crucial para definir o futuro do saneamento básico na cidade.

Cabe lembrar que em paralelo a isso segue a todo vapor a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara Municipal de Vereadores, mas quem deve muitas explicações para a população blumenauense é a AGIR, que deveria ter identificado as falhas, mas preferiu orientar o reajuste de tarifa, causando um ônus ainda maior à população. Aliás, a CPI foi criada justamente para investigar os reais motivos do 5º aditivo, agora revogado e seu objeto perderia sentido.

Mesmo com revogação do aditivo, presidente do Samae será ouvido pela CPI

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara de Vereadores de Blumenau, que apura possíveis irregularidades no contrato de concessão do serviço de esgotamento sanitário no município, convocou o presidente do Samae, Alexandre de Vargas, para prestar depoimento na próxima reunião do colegiado.

A oitiva está marcada para terça-feira (12), a partir das 10h, no Plenário da Câmara, mesmo com a revogação do aditivo. Vargas foi chamado em substituição ao presidente da Comissão de Esgotamento Sanitário (SPES) do Samae, que havia sido indicado para depor, mas está em licença-paternidade.

Segundo os parlamentares da CPI, a presença de Vargas é essencial por ele ocupar o cargo máximo da autarquia e ter responsabilidade direta na gestão do contrato com a concessionária BRK Ambiental. Alexandre assumiu a presidência do Samae em 2 de janeiro de 2025, conforme registro oficial do órgão.

O presidente da CPI, vereador Diego Nasato (Novo), destacou que a oitiva busca esclarecer o papel do Samae nas decisões que levaram à formalização do 5º Termo Aditivo do contrato, especialmente no que se refere à alteração do modelo técnico de universalização do serviço e aos impactos tarifários para os consumidores.

A comissão segue conduzindo análises documentais, oitivas de autoridades e representantes e mantendo espaço para que diferentes atores apresentem informações e posicionamentos sobre o contrato de concessão. Apesar disso, o vereador Flávio Linhares (PL), líder de governo no Poder Legislativo deve solicitar o arquivamento da Comissão. Segundo o parlamentar, ele irá recomendar que a CPI vire uma comissão de acompanhamento.

Posição da BRK

O Mesorregional fez contato com a BRK no decorrer desta segunda-feira (11), que através de sua assessoria emitiu uma nota oficial sobre a situação. A nota segue na íntegra logo abaixo:

A BRK informa que recorreu à Justiça para assegurar o cumprimento do 5º aditivo contratual, evitando prejuízos às metas de universalização dos serviços de saneamento em Blumenau. O contrato previa um procedimento detalhado para a realização da auditoria e prazo para a avaliação de seus resultados. Conforme estabelecido, após análise da BRK, parecer de consultoria especializada e manifestação da agência reguladora – etapas que não foram observadas –, os resultados da auditoria seriam considerados em uma nova revisão, a ser processada pela própria agência. Desde o início da concessão, a BRK já investiu cerca de R$ 400 milhões no sistema de esgotamento sanitário de Blumenau, e está contratado o financiamento para mais R$ 300 milhões, como resultado das obras de universalização do 5º aditivo. Caso o decreto municipal seja mantido, haverá impacto direto na expansão do saneamento, comprometendo o avanço que poderia tornar Blumenau a primeira cidade de Santa Catarina a atingir as metas do novo Marco Legal do Saneamento.

O Mesorregional também obteve acesso ao Mandado de Segurança ingressado pela BRK Ambiental junto ao Poder Judiciário. A empresa tenta alegar que aditivo, assinado em março deste ano “após cinco anos de análises técnicas pela Agência Intermunicipal de Regulação (AGIR), garantia o equilíbrio econômico-financeiro do contrato e viabilizava um financiamento de R$ 293 milhões para investimentos no sistema de esgoto.”

Além disso BRK alega que a revogação do aditivo ameaça investimentos já que o contrato de financiamento seria essencial para universalizar o esgoto até 2029, está vinculado à vigência do aditivo e que a revogação suspenderá os repasses e paralisar obras. Alega ainda que a Prefeitura teria ignorado o devido processo legal, já que o decreto foi baseado em uma auditoria encomendada pelo SAMAE, cujos resultados não foram submetidos à AGIR nem à concessionária para defesa prévia, sem o direito ao contraditório e questiona a segurança jurídica, já que o aditivo já previa um rito específico para incorporar as conclusões da auditoria, além de, por fim alegar que o decreto foi publicado às vésperas do depoimento do presidente do SAMAE à CPI do Esgoto, instaurada para investigar o aditivo, sugerindo motivação política.

Próximos passos

Agora a Justiça analisará o pedido liminar da BRK. No decorrer desse processo, a AGIR, que deve muita explicação à sociedade blumenauense poderá ser consultada sobre a revogação e poderá se manifestar tanto dentro, quanto além do processo.

Foto: Jefferson Santos / Mesorregional

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