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Lista de infrações e pontuações do acusado na audiência de custódia pode ajudar a mantê-lo preso

Por Marcia Pontes, colunista do Notícias Vale do Itajaí

Todo motorista que bebe, dirige e mata no trânsito pode ser denunciado de duas formas: pelo artigo 302 do CTB, por homicídio culposo, e pelo artigo 121 do Codigo Penal, por dolo eventual (assumiu o risco de produzir o resultado).  Se for denunciado pelo CTB, praticamente a lei obriga o juiz a conceder a liberdade provisória para responder em liberdade, no final não vai preso e cumpre sentença em liberdade em troca de algumas cestas básicas. Isso na esfera criminal porque a ação indenizatória vai correr na esfera cível. Já, se a denúncia for por dolo eventual é possível que o réu responda preso até o final do processo e, se condenado, cumpra a pena em regime fechado dependendo da gravidade. O que vai determinar o tipo de denúncia, se por homicídio culposo ou por dolo eventual, é a gravidade da conduta do motorista até chegar ao resultado morte e o seu histórico como motorista: se ele já se envolveu em outros crimes de trânsito com embriaguez, se já tinha autuações/multas anteriores por embriaguez ao volante, se já respondeu a processo pelo mesmo motivo, se vinha cometendo infrações de embriaguez continuadas, dentre outros. É nesse ponto que a apresentação do prontuário do motorista pode fazer toda a diferença para manter a prisão ou conceder a liberdade provisória.

Durante a audiência de custódia participam o motorista embriagado que dirigiu e provocou lesões corporais ou morte, o Promotor de Justiça, os advogados defensores do réu e em alguns casos os advogados das vítimas. Em alguns casos porque a morte foi recente, a família está fragilizada e envolvida com o funeral e não contrata o advogado a tempo de participar da audiência de custódia. Nesse momento, o Ministério Público, que é o autor natural da ação penal e fiscal da aplicação da lei, fará de tudo que está previsto em lei para manter a prisão de quem bebe, dirige e mata. O juiz, por sua vez, analisará os fatos que trouxeram o acusado à audiência e vai formar a sua convicção se o réu se enquadra em homicídio culposo (pelo CTB) ou com dolo eventual (pelo Código Penal). É com base nisso e bem fundamentado na lei que o juiz vai decidir se dali o réu segue direto para casa ou para o presídio.

Só que nem sempre todas as informações que podem ajudar a manter quem bebe, dirige e mata preso são apresentadas na audiência de custódia e uma das mais importantes é o prontuário de infrações do motorista. Sem ele, o juiz até pode consultar se o acusado já responde a outras ações penais por embriaguez, mas se o prontuário de infrações do motorista não é apresentado ele fica sem saber se esse motorista já foi autuado por embriaguez anteriormente, se já se recusou a fazer o teste de etilômetro ou se responde a processo administrativo para a suspensão do direito de dirigir.

Casos emblemáticos

No primeiro semestre tivemos na região o caso de um motorista que bebeu, dirigiu, matou e foi solto em audiência de custódia para responder em liberdade por homicídio culposo pelo Código de Trânsito (aquele que no final não dá prisão e resulta em pagamento de cesta básica). Só que analisando o prontuário de infrações desse motorista constatou-se que ele já tinha se envolvido em crime de trânsito por embriaguez em 2015, em 2017 e agora em 2019. Será que o prontuário de infrações de trânsito desse motorista foi apresentado ao juiz em audiência de custódia?

No caso do motorista do Chevette, Gabriel Rodrigo Rohde, que dirigiu embriagado após sair de uma festa e atropelou e matou Deivanir Paganardi  que empurrava a bicicleta na calçada,  ele (o motorista do Chevette) já tinha sido autuado numa fiscalização de trânsito por recusar-se a fazer o teste de etilômetro. Foi no dia 3 de março deste ano (2019), às 17h48 ao lado do Posto Zandoná, em Massaranduba e, por esta infração, já estava autorizado o Detran a instaurar processo para a suspensão do direito de dirigir do motorista do Chevette. Só que o Detran tem o prazo legal de 5 anos para punir e não costuma ser tão rápido, porque caso fosse, Gabriel Rodrigo Rohde nem poderia mais estar dirigindo.

Detalhe: essas informações do prontuário de infrações do motorista do Chevette não foram apresentadas ao juiz na audiência de custódia, o que seria um requisito fundamental para justificar a garantia da ordem pública, para sustentar a acusação do Ministério Público por dolo eventual e para manter o motorista do Chevette preso, porque se soltar na audiência de custódia não prende mais, a menos que o acusado viole algumas das medidas cautelares como fez João Pizzolatti.

Outro detalhe: já na audiência de custódia de Evanio Prestini o Ministério Público apresentou a lista de infrações e pontuações do acusado, até porque já circulavam na imprensa e nas redes sociais, e isso pesou e muito para reforçar as argumentações do Ministério Público pela prisão preventiva do motorista do Jaguar.

Sugestão aos Promotores, Magistrados e advogados assistentes de acusação

Como especialista em Direito de Trânsito a minha sugestão aos Promotores de Justiça e aos advogados assistentes de acusação, que são aqueles contratados pelas famílias das vítimas para participar também da audiência de custódia, é que a partir dos dados pessoais dos motoristas alcoolizados que dirigiram e mataram (e para qualquer outro crime de trânsito) se consulte imediatamente o dossiê do veículo e a lista de infrações cometidas pelos acusados antes mesmo da audiência de custódia e que se leve esses dados aos magistrados para ajudar a formar a sua convicção.

Como os boletins de ocorrência do acidente costumam levar alguns dias para ficarem prontos, os dados pessoais do motorista acusado podem ser obtidos do Auto de Prisão em Flagrante (APF) e imediatamente consultados online pela página do Detran/SC. Com os dados de placa e renavam os Promotores de Justiça e advogados assistentes de acusação ficam sabendo se o veículo pertence ao motorista que dirigiu embriagado e matou alguém, se estava com licenciamento atrasado, se havia restrições de circulação, de transferência, de RENAJUD ou qualquer outra atrelada à placa do veículo, inclusive se havia gravames, o histórico de infrações e de multas pagas e em aberto, quem cometeu essas infrações, se foram infrações recentes, inclusive por alcoolemia.

Com os números do CPF e do registro da CNH do motorista que aguarda a audiência de custódia, os Promotores de Justiça e advogados assistentes de acusação ficam sabendo imediatamente quantos pontos o motorista acusado têm em seu prontuário: quais as infrações, quando, o dia, a hora, o local, o ano, o código de enquadramento da infração, o artigo do CTB, se essas infrações já instauram o processo administrativo de suspensão do direito de dirigir e o principal: se são infrações por alcoolemia que levem à presunção legal ou constatação de cometimento de infrações continuadas de mesmo tipo ou não.

Muitas vezes, por ignorar que uma consulta rápida possa ser tão oportuna e decisiva, muitos advogados assistentes de acusação e até o Ministério Público solicitam dentro do processo o fornecimento desses dados, o que é perda de tempo e compromete a celeridade processual. É simples, os dados já estão no Auto de Prisão em Flagrante: basta consultar online, imprimir e entregar ao juiz durante a audiência de custódia.

São provas importantes que podem ajudar o juiz a formar a sua convicção, a demonstrar que o acusado comete infrações continuadas de beber e dirigir e que com isso está assumindo o risco de matar. Mesmo quando o juiz consulta no sistema do judiciário e não encontra nenhuma ação penal vinculada ao nome do acusado. São provas passíveis de serem obtidas imediatamente, sem nenhuma ilegalidade e que ajudam a tirar a acusação do homicídio culposo pelo CTB e embasar a denúncia do Ministério Público por dolo eventual. Com isso aumentam-se as chances de manter a prisão do motorista que bebe, dirige e mata já no final da audiência de custódia para que ele responda preso até a decisão em júri popular.   Com certeza, se esses dados sobre infrações, multas e pontuações do motorista acusado fossem levados a tempo para a audiência de custódia seriam fundamentos importantes para o requisito da garantia da ordem pública, para fundamentar a prisão preventiva e a denúncia por dolo eventual, que aliás, não está morto.

Márcia Pontes
Especialista em Trânsito

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