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Por que os adultos ainda não protegem as crianças no trânsito?

Por Márcia Pontes, colunista do Notícias Vale do Itajaí:

 

Se não fossem dados oficiais não daria para acreditar que aumentou em 57% o número de pais e outros adultos autuados por transportarem crianças em seus veículos sem o dispositivo de segurança adequado. Hoje cedo ao parar no semáforo ao lado de uma Saveiro do entregador de gás de cozinha, ao constatar que ele estava sem o cinto de segurança, sugeri que ele se protegesse e colocasse o cinto: recebi de volta um sorriso simpático, um sinal de positivo e a resposta: “não dá nada, eu dirijo devagarinho.” Minutos depois, mais adiante, no semáforo próximo ao terminal da Fonte a mesma cena se repetiu: um pai transportava o bebê na cadeirinha, mas ele, o condutor, estava sem cinto. Sugeri que se protegesse também e colocasse o cinto, mas esse foi arrogante: olhou com cara de quem não estava nem aí para mim e para a própria segurança e saiu acelerando antes do semáforo abrir para o verde. Por que certos condutores não dão a mínima para a própria proteção e ainda não usam o cinto?

Pelas ruas de Blumenau, do Centro aos bairros, as cenas se repetem: crianças soltas nos bancos de trás dos veículos, umas no colo das outras; crianças com menos de 10 anos transportadas no banco da frente, no colo do motorista e até em pé, com a cabeça para fora do teto solar dos veículos. Quem já flagrou crianças menores de 7 anos transportadas em motos de qualquer maneira levanta a mão! Crianças escorregando pelo banco da moto, as perninhas quase encostando no aro da roda; aquele capacete enorme quase saindo da cabeça da criança. Um reflexo dos adultos que não dão a mínima para a própria segurança? Afinal, se não cuidam nem de si próprios, quem dirá das crianças!

Blumenau é uma cidade que se destaca por uma série de coisas: pela qualidade de vida, pelos aspectos culturais, pelo alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), pelo baixo índice de analfabetismo, e por tantos outros aspectos. Mas, parece que certos adultos são tapados para o quesito uso de cinto e outros dispositivos de segurança. Inclusive, oficialmente, foram duas mortes recentes de crianças com o corpo projetado para fora do carro no Vale do Itajaí.

 

A burrice que alimenta o discurso de indústria da multa

Me perdoem os equinos e muares, mas não usar cinto de segurança é uma burrice que alimenta o discurso de indústria da multa. Aquele que diz que o trabalhador não deve ser multado porque já paga impostos demais (como se penalidade de multa fosse imposto) e tantos outros argumentos de vidro. É justamente esse tipo de motorista que deixa de usar o cinto com dolo e com vontade e que depois de autuado arrota o discurso de indústria da multa.

Quem é autuado por não usar cinto de segurança comete infração grave, 5 pontos, e paga uma multa de R$ 195,23. Pode recorrer, mas nem deveria. Assume a burrada que fez e passe a usar o cinto que dá mais certo. Transportar crianças fora do bebê conforto, da cadeirinha e do assento de elevação é infração gravíssima, 7 pontos e multa de R$ 293,47. Para arrecadar? Não, é para entender que isso é infração, que passe a usar o cinto e evite a morte dessas e de outras pessoas.

Se há muitos pais e outros adultos flagrados por câmeras de videomonitoramento dirigindo sem cinto, transportando outros adultos ou crianças sem o dispositivo de proteção adequado e não podem ser autuados, coloquem na conta dos vereadores que aprovaram uma lei inconstitucional assinada pelo Executivo, e que passou a proibir (ferindo os princípios da legalidade e da vergonha na cara) as autuações desses adultos que colocam a vida das crianças em risco. Tudo para fazer média e tentar ganhar votos de motoristas infratores, que não são poucos.

 

Leis da Física que o motorista não engana

Certos políticos podem enganar os eleitores, certos motoristas podem enganarem-se a si mesmos, mas as leis da Física ninguém engana.

Mesmo que um veículo esteja numa velocidade de 20 Km/h, o impacto contra um objeto fixo resulta numa força superior a até 15 vezes ao peso da pessoa. Um adulto sem cinto ou criança sem o dispositivo adequado de proteção para a sua idade, sofrerão graves ferimentos, que em muitos casos, podem ser fatais. Principalmente bebês e crianças maiores. Dados de Acidentologia revelam que 8 em cada 10 pessoas que não usavam cinto de segurança morreram em acidentes com, pelo menos, um dos veículos a menos de 20 Km/h.

Mesmo a 10km/h, devagarinho como tentou justificar o motorista entregador de gás, sem cinto de segurança, já é o suficiente para que o tórax seja comprimido contra o volante em uma freada brusca.

A 40km/h e sem cinto, as lesões fatais em colisões são provocadas  porque a vítima bateu contra o volante. Outras 40% das mortes em acidentes são causadas por choque em parabrisas ou contra o painel de instrumentos, só que a 40km/h o motorista e o passageiro sem cinto no banco da frente já são atirados violentamente contra o parabrisas e arremessados para fora do carro.  Uma em cada 5 lesões é porque pessoas dentro do veículo bateram-se umas contra as outras no banco de trás.

Em uma colisão a 60 km/h, o peso é multiplicado por 50: uma mala de 7kg atinge 350 kg; um cachorro de 10kg atinge 500kg, uma criança de 20kg atinge uma tonelada ou o equivalente ao peso de um urso. Uma mulher de 50kg atinge 2,5 toneladas, o peso de um rinoceronte; e um homem de 70kg atinge 3,5 toneladas, o peso de um hipopótamo. A esta velocidade, se um adulto transporta uma criança no colo, no caso de acidente ambos são projetados para a frente e o adulto espreme a criança contra o banco dianteiro ou contra o painel, ferindo-a gravemente ou provocando a sua morte.

Em uma colisão a 65 Km/h os passageiros sofrem um impacto equivalente a 820 Kg. Em uma colisão contra objeto fixo a 60Km/h, equivale a cair de um prédio de 4 andares (uma altura de aproximadamente 14 metros). O uso de equipamento de segurança, como bebê-conforto, cadeirinhas, booster e cintos de segurança de três pontos, reduzem em 70% os riscos de mortes e lesões graves em crianças num acidente de trânsito.

E para quem tenta justificar que é bem pertinho, é logo ali e não precisa de cinto ou de dispositivos de segurança para as crianças e adultos, saibam que cerca de 75% dos acidentes ocorrem num raio de 30 Km da residência do motorista. Bem no trajeto mais conhecido, familiar, pertinho de casa, em que o motorista relaxa mais com a própria segurança e a de seus passageiros.

As pessoas precisam parar de acreditar que acidentes de trânsito só acontecem com os outros. Precisam parar de “achar” que têm controle sobre tudo enquanto estão dirigindo e que nada vai acontecer com elas. As pessoas precisam ser mais responsáveis com a própria vida, com a vida dos outros e, sobretudo, com a vida das crianças. Porque desde que o mundo é mundo são os adultos que educam e protegem as crianças. Na vida e na via.  

 

Márcia Pontes
Especialista em Trânsito

Representante do Maio Amarelo em Santa Catarina

 

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